Cristina Pimentão num webinário sobre mobbing: “O trabalho não pode doer”

15-6-2022

Cristina Pimentão num webinário sobre mobbing: “O trabalho não pode doer”

"O trabalho não pode doer". Com esta frase, a investigadora Cristina Pimentão colocou a audiência em estado de alerta, no webinário FNE e AFIET "Mobbing - o assédio moral no trabalho", que decorreu em 15 de junho de 2022, entre as 17 e as 18h00. Poucos tinham despertado para a força de tamanha mensagem, numa apresentação fluída, que contou com várias perguntas dos participantes, perante um tema sobejamente conhecido, mas do qual se desconhecem muitas variantes.

Cristina Pimentão é psicóloga e professora Auxiliar na Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da Universidade Fernando Pessoa, e desconstruiu durante uma hora aquilo que, culturalmente, muitos desprezam e desvalorizam. E a oradora convidada deste evento começou por apresentar a definição de mobbing, dada por Heinz Leymannn, em 1990: “Terror psicológico no contexto de trabalho, significa uma comunicação hostil e antiética, dirigida de forma sistemática por uma ou mais pessoas sobretudo a um determinado indivíduo. Estas ações ocorrem frequentemente (quase todos os dias) e durante um longo período (pelo menos durante 6 meses) e por causa desta frequência e duração, resultam num considerável dano psiquiátrico, psicossomático e social”.

Para Cristina Pimentão, apenas se pode falar de assédio quando existe uma intencionalidade por parte do agressor e uma prática sistemática dos processos que o caracterizam. O Código do Trabalho apresenta a sua própria definição de assédio e de assédio sexual no artigo 29º, mas há muito ainda que desenvolver neste “comportamento indesejado”, que constitui uma contra-ordenação muito grave, seja quando for do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional.

Leymann desenvolveu e validou um instrumento de medida do mobbing, que identifica um conjunto de comportamentos que auxiliam a circunscrever o fenómeno, estruturados em três grupos de manipulação da vítima (da comunicação, da reputação, do trabalho) e de um grupo de manipulação das contrapartidas laborais. O assédio/mobbing tem várias designações em diferentes e nos seus antecedentes encontramos, entre outros, a inveja, o racismo, a xenofobia, a perseguição política, inimizades pessoais ou o abuso de poder.

Do lado das consequências, Cristina Pimentão citou uma ansiedade constante, agressividade, irritabilidade, perda de autoestima, alterações na afetividade e desejo sexual, separação matrimonial, depressão, alcoolismo ou no limite o suicídio. Para o combater urge romper o silêncio, registar toda a informação possível sobre a prática do assédio, partilhar o problema dentro e fora do trabalho e procurar ajuda na ACT – Autoridade para as Condições de Trabalho ou na Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE).

O professor Rui Maia, do Centro de Formação da FNE, moderou este webinário, sublinhando que tudo o que é disfuncional no local de trabalho interessa, pelo que é fundamental aumentar a literacia sobre o mobbing. Cristina Pimentão referiu por seu lado que "o trabalho não pode doer. E se o trabalho dói, então temos um sinal de alerta que não podemos ignorar".

Fazer prova é preciso

O debate prosseguiu com a resposta a questões levantadas pelos participantes, uma delas se não seria altura de irmos mais longe na legislação. Cristina Pimentão respondeu que "se o mobbing for provado tem moldura penal, mas há matéria para acentuar a penalização desta prática para crime".

Outra situação focada foram os danos psicológicos derivados deste processo. Quanto a esses, a psicóloga acentuou categoricamente que "normalmente o mobbing deixa consequências impactantes para a vítima. As pessoas deixam muitas vezes a situação correr e quando dão por elas desembocam num burnout, depressão e por vezes até em suicídio".

Rui Maia lançou por fim o desafio de se perceber se há pessoas que se aproveitam indevidamente do processo para dele retirar proveitos próprios, como indemnizações, mas Cristina Pimentão desmistificou de imediato a questão, assumindo que apesar de não existirem ainda muitos estudos sobre este tema, o assédio efetivo continua a ser mais frequente. De qualquer modo, “as pessoas têm sempre que fazer prova. E caso seja falso, a sua reputação leva um enorme abalo".

O moderador do webinário finalizou com a eventualidade de a FNE e AFIET voltarem a este tema. O interesse demonstrado pelos participantes foi elevado e várias questões ficaram para outra oportunidade. O mobbing no trabalho é real, embora muitos finjam que ele não existe. Falar dele, reagir, procurar apoio e produzir mais investigação são caminhos a seguir.

Reveja aqui o Webinário "Mobbing - o assédio moral no trabalho"