Secretário-Geral da UGT no Fórum FNE 2019: “O que se tem feito aos professores é uma traição à Democracia”

12-11-2019

Secretário-Geral da UGT no Fórum FNE 2019: “O que se tem feito aos professores é uma traição à Democracia”
O primeiro dia do Fórum FNE 2019 (8 de novembro) decorreu no Hotel Barcelona e promoveu a apresentação e debate de ideias sobre o tema "Mais unidos, mais fortes, por uma ação sindical de reforço dos Sindicatos e de valorização das pessoas".

A sessão de abertura esteve a cargo de Jorge Santos, Presidente da FNE e de Carlos Silva, Secretário-Geral (SG) da União Geral de Trabalhadores (UGT). O Presidente da FNE destacou o papel dos sindicatos na valorização dos trabalhadores e alertou que neste momento em que uma nova legislatura se inicia "é necessário colocar as pessoas a falar sobre os problemas da educação", sublinhando a importância deste setor na sociedade. Já o líder da UGT começou por relembrar e agradecer o papel que os professores tiveram na sua vida e carreira, considerando que "é uma traição à democracia aquilo que tem vindo a ser feito aos professores. Onde está o espírito social que é uma virtude da democracia? A FNE pode contar com a UGT para dar voz neste caminho pela valorização e defesa dos profissionais da educação", finalizou.

Mafalda Troncho, Diretora do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em Lisboa, liderou em seguida o debate sobre o tema "A OIT nos seus 100 anos e a ação pelo trabalho digno". A dirigente da organização que em 1959 recebeu o Prémio Nobel da Paz, começou por apresentar a missão e objetivos da OIT que passam por projetos em mais de 100 países e que visam reforçar a implementação das normas da instituição, a investigação, assistência técnica e apoio aos constituintes, assim como concretizar prioridades nacionais através de programas de trabalho digno específicos por país, além do apoio na implementação de políticas de desenvolvimento num clima de igualdade, dignidade e liberdade. Em seguida, Mafalda Troncho apresentou alguns dos momentos históricos da OIT assim como a visão da organização sobre o futuro do trabalho, que assenta em três prioridades de ação: aumentar o investimento nas capacidades das pessoas; aumentar o investimento nas instituições do trabalho e aumentar o investimento no trabalho digno e sustentável, finalizando a sua participação lembrando que "quem desenha o futuro é a sociedade e não a tecnologia".

Seguiu-se um período de debate e questões que versaram temas como a forma como a OIT prevê gerir a relação com os sindicatos na questão da dignidade e valorização dos trabalhadores no futuro, o seu papel na CPLP e também quais as ideias para superar os desafios que a comunicação digital traz à sociedade.

A tarde do primeiro dia do Fórum FNE 2019 abriu com duas sessões paralelas. Numa sala aconteceu o debate sobre "O regime jurídico dos trabalhadores não docentes – 20 anos depois; que desafios à intervenção sindical", com Carlos Guimarães, ex-Vice-SG da FNE e ex-Presidente do Sindicato dos Técnicos Superiores, Assistentes e Auxiliares de Educação da Zona Norte (STAAEZN) e João Ramalho, Presidente do Sindicato dos Técnicos Superiores, Assistentes e Auxiliares de Educação da Zona Centro (STAAEZC).

No lançamento da sessão foi reforçado pelo SG da FNE que a atual insuficiência de Trabalhadores Não Docentes não pode continuar a suceder, que nesta nova legislatura o papel destes seja respeitado e valorizado, pois os "Funcionários de escola também educam", algo que o Governo teima em esquecer e que é necessário recordar de várias formas nos próximos quatro anos.

João Ramalho fez depois uma apresentação relativa às dificuldades que os trabalhadores não docentes têm tido nos últimos anos para serem ouvidos pelo poder. Foi ali referido o percurso realizado pela FNE com apresentação de um modelo de carreiras no início da anterior legislatura, mas a que o Ministério da Educação nunca deu seguimento para negociar, sendo ainda questionado o facto de o anterior Governo não ter aberto também negociações para o estabelecimento de carreiras dos trabalhadores não docentes. Ficou claro nesta sessão que os trabalhadores não docentes fazem um balanço claramente negativo da anterior legislatura, sendo até referido que "nada aconteceu. Ninguém nos ouviu em qualquer ponto. Os trabalhadores não docentes vivem um autêntico drama com este esquecimento hoje em dia nas escolas, onde são pedra fundamental no seu bom funcionamento". Carlos Guimarães, após apresentar uma retrospetiva do percurso que levou à formação dos STAAE's e das lutas que levaram à negociação do Decreto-Lei 515/99, de 24 de novembro, deixou o alerta: "Precisamos urgentemente que abram negociações nesta matéria das carreiras e em outras. Temos de ser ouvidos e reconhecidos nas nossas preocupações, tais como a passagem de competências para as autarquias, olhar para o envelhecimento e cuidar da formação dos profissionais não docentes", rematou.
 
ECD continua a ser um marco de referência

Em paralelo, Conceição Castro Ramos, ex-Presidente da Comissão Interministerial de Regulamentação do Estatuto da Carreira dos Educadores e Professores dos Ensinos Básico e Secundário apresentava o tema "O Estatuto da Carreira Docente (ECD) – 30 anos e 17 revisões depois; que desafios à intervenção sindical".

A convidada começou por relembrar os eixos e princípios fundadores do ECD, que se baseavam na valorização profissional e social dos professores e melhoria qualitativa do exercício da função educativa, na estabilidade profissional, na relevância das qualificações, avaliação de desempenho e participação na decisão política. Mas a aplicação do ECD, cujo processo de criação se estendeu por dois anos de negociações e que foi um projeto inédito de concertação entre os vários sindicatos da educação, passou já por várias mudanças onde se destacam 10 governos, seis ciclos político-partidários, 17 revisões e uma particularidade: três leis da Assembleia da República. Tudo isto, segundo Conceição Castro Ramos, "provocou linhas de rutura na estrutura da carreira, na avaliação de desempenho, mas 30 anos e 17 revisões depois o ECD continua a ser um marco de referência e um instrumento apropriado no século XXI, pois é um esteio na valorização e qualificação profissional docente e os seus valores e princípios são fonte de inspiração e desafio por cumprir". A terminar ficou a ideia de que alguns dos grandes desafios do ECD para o futuro passam por cumprir a estabilidade e uma equidade profissional no recrutamento, além de um reforço de presença no espaço público.

A plateia colocou depois algumas questões para debate que se centraram na adaptação do ECD aos tempos atuais e qual a melhor forma de articular os desafios sindicais que se aproximam com um ECD que já viveu tantas mudanças e que transcende uma linha histórica.

Vítor Hugo Sequeira, antigo Presidente do Sindicato de Trabalhadores de Escritório Comércio Serviços e Novas Tecnologias (SITESE) e da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Escritório e Serviços (FETESE) e antigo membro do Conselho Económico e Social Europeu foi o convidado para liderar o tema "O movimento sindical em Portugal depois do 25 de abril; o papel e o lugar da UGT" e iniciou a sua participação fazendo uma resenha histórica sobre como Portugal geriu no pós 25 de Abril a criação de sindicatos, assim como o papel da UGT no movimento sindical português: "Em 1978, na sala do cinema Lumiar, em Lisboa, quando a UGT foi criada por 47 sindicatos (oito dos quais com estatuto de observador) sentia-se que as pessoas queriam uma sindicalização diferente, e a UGT quando surgiu permitiu aos trabalhadores prosseguir um caminho com uma organização que permitia um pluralismo sindical e um direito de tendência", acrescentando que "hoje posso dizer que sem a UGT o país seria mais pobre", tendo depois debatido algumas questões ligadas aos desafios que se impõe ao movimento sindical como a falta de negociação coletiva, a diminuição e a dificuldade em sindicalizar trabalhadores, a necessidade de reinvenção dos sindicatos, assim como a independência dos sindicatos relativamente à Central Sindical e aos partidos políticos.

A fechar o primeiro dia do Fórum FNE 2019, "A negociação coletiva na Administração Pública e no setor privado na área da Educação – realidades e desafios" foi o assunto na mesa que contou com Sérgio Monte, SG-Adjunto da UGT e ex-SG do Sindicato Ferroviário de Revisão Comercial Itinerante (SITRA) e José Abraão, SG da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP) e do Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (SINTAP) como convidados. O SG da FESAP deixou elogios à "cultura de negociação e compromisso que a UGT e os seus sindicatos defendem", reforçando depois alguns dos desafios à negociação coletiva e a necessidade de se lutar cada vez mais contra a precariedade dos Trabalhadores Não Docentes, apelando ao compromisso e à negociação.

Já Sérgio Monte começou por referir que "o Governo enquanto patrão tem de tratar bem os seus trabalhadores. Não o fazendo dá um mau exemplo que os privados podem vir a aproveitar cada vez mais", lançando em seguida a questão "vale a pena ser sindicalizado? Eu respondo que sim, mas deverão os sindicalizados e não sindicalizados ter os mesmos direitos ao nível das convenções? Este é um desafio para debates futuros", dizendo a fechar que "a prioridade da UGT neste momento é a luta pela melhoria dos salários, mas sabemos que o Governo tem sempre uma agenda de ilusão para com os trabalhadores". A plateia lançou ainda à mesa questões à volta da pulverização sindical que se verifica em alguns momentos na atualidade e como combater a desvalorização da representatividade dos sindicatos nos acordos e como porta-voz dos trabalhadores.

Unidos na causa da Educação

O segundo dia do Fórum FNE 2019 (9 de novembro) abriu com o tema "Uma escola que se organiza e trabalha para os seus alunos e respeita os seus Profissionais", que contou com o autor de temas educativos Jorge Rio Cardoso, Jorge Ascenção, Presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP) e Rosa Pedroso Lima, jornalista do Expresso, como convidados.

Jorge Rio Cardoso foi quem lançou a conversa matinal transmitindo primeiramente a mensagem de que o ensino deve ser atrativo e deve ir ao encontro do que o aluno gosta, pois na sua opinião "a escola deve ser um espaço de criação de sabedoria e é necessário criar um elo maior entre professor e aluno". O autor de temas educativos disse ainda que "é importante educar as emoções, retocá-las quando as coisas não estão bem, de forma que se formem seres humanos equilibrados racionalmente", acrescentando a fechar a sua intervenção que se motivarmos os jovens para a vida certamente teremos melhores alunos na escola. Nunca devemos desistir de uma melhor educação".

Já Jorge Ascenção reforçou a proposta que os professores devem ter mais autonomia nas salas de aula e perceber que a escola tem um papel tão ou mais importante às vezes que a família, pois defende que "esta pode ser uma forma de antecipar os problemas, evitando-os. Quanto mais perto estivermos dos alunos e das suas situações de vida, mais facilmente podemos perceber o que está mal e que pode criar problemas. E isso percebe-se através de determinados sinais que com atenção podemos percecionar", concluindo dizendo que "a escola tem de ser um espaço de bem-estar, de partilha de pensamento, de inclusão e acima de tudo um lugar de liberdade e criatividade".

Rosa Pedroso Lima, jornalista do Expresso, recuou até 2008 para relembrar que nessa data se falava três vezes mais de professores do que de juízes, agricultores e médicos. Segundo a jornalista vivemos uma fase social onde mudou a perceção pública da educação: "As publicações de temas sobre educação reduziram, aposta-se apenas nas "breaking news" deixando de lado a investigação. A mensagem dos sindicatos é considerada menos 'sexy' e menos lida também", referiu. Depois, já em resposta a algumas perguntas da plateia, Rosa Pedroso Lima assumiu que os sindicatos têm um desafio pela frente que é o de se fazerem ouvir nos meios de comunicação, deixando uma recomendação: "É uma missão difícil. Fazerem-se ouvir não deve implicar perder os valores que o sindicalismo sempre teve e deve manter. Há coisas que considero serem boas, como por exemplo a criação de conteúdos internos por parte dos sindicatos. É lá que muitas vezes os jornalistas vão buscar material para criar notícia".

Dom Carlos Ximenes Belo, Prémio Nobel da Paz, antigo Bispo de Dili e patrono da escola de Kelicai, esteve presente no Fórum FNE 2019 para uma cerimónia de entrega do contributo recolhido pelos Sindicatos da FNE para a reconstrução da escola do reino de Kelicai, em Timor-Leste. O antigo Bispo de Dili agradeceu a todos os que foram solidários com esta campanha, que permitiu alcançar um contributo financeiro significativo.

A finalizar este Fórum FNE 2019 aconteceu o painel de debate sobre os trabalhos realizados com a moderação dos dirigentes da FNE, Manuel Teodósio Henriques, Maria de Fátima Carvalho, Cristina Ferreira, Laura Rocha, Manuela Diogo, Libânia Maria Conceição e Eva Vidal, em que foi apresentado um resumo de todas as mesas de debate por cada relator, seguindo-se o discurso de encerramento do SG da FNE, João Dias da Silva, que realçou a importância deste evento no sentido do fortalecimento do movimento sindical e da maior preparação para os desafios que se aproximam no novo ciclo de política sindical, considerando que "só conseguimos dar uma imagem ainda melhor quando todos desde alunos, a professores, pais, docentes e não docentes se mostrarem unidos na causa da educação. Agora vamos para as escolas e para a ação sindical", terminou.

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