7-1-2020
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Para a FNE, o Orçamento de Estado para 2020 é dececionante e preocupante, porque não contém o suporte orçamental que deveria permitir as medidas políticas que são essenciais à alavancagem das múltiplas assimetrias e desigualdades do nosso sistema de Educação e Formação, nem à consequente valorização dos docentes e dos não docentes das nossas escolas, e capaz de melhorar as suas condições de desenvolvimento pessoal e de carreiras, mobilizadoras de uma intervenção profissional que seja garantia de uma escola pública de qualidade e equidade, onde todos encontrem resposta às suas necessidades e aos seus desafios.
O Primeiro-Ministro anunciou que este Orçamento é um orçamento de continuidade.
O que nos dececiona e nos preocupa é que a continuidade anunciada corresponde ao prosseguimento de políticas que deveriam ter sido ultrapassadas. Esta ideia de continuidade corresponde à intenção única de garantir um excedente orçamental através de políticas de constrangimento do investimento, de fixação de baixas expetativas em termos de remunerações e de carreiras, de dependência do bolso dos contribuintes, através de uma carga fiscal que em vez de reduzir antes se diversifica nas suas fontes de financiamento.
Este orçamento de continuidade é um orçamento que pretende que tudo fique na mesma, que não tem ambição, que não define novas metas mobilizadoras da sociedade em geral e dos trabalhadores em particular e que, por isso, é incapaz de promover a adesão e a aprovação. E essa continuidade chega até ao ridículo de um aumento de 0,3% que é anunciado para os trabalhadores da administração pública, com a vaga promessa de que talvez, por efeitos de negociação, possa subir mais uma ou duas décimas.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a contar com uma classe docente cada vez mais envelhecida, cansada e descontente, sem autoridade reconhecida, e desperdiçando o seu capital de experiência que poderia ser essencial para o enquadramento de novos profissionais jovens, e adiando incompreensivelmente a sua passagem à reforma ou sequer a situações negociadas de pré-reforma, apresentadas como possíveis apenas para o meio da Legislatura.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a não reconhecer a totalidade do tempo de serviço prestado e que foi congelado, impedindo que seja considerado para efeitos de desenvolvimento das carreiras de milhares de docentes e de outros trabalhadores da administração pública das carreiras ditas especiais.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a obstruir a entrada de jovens professores, que permitam o rejuvenescimento da profissão docente, que todos os estudos nacionais e internacionais exigem.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a assentar na falta de profissionais não docentes nas escolas, nas bibliotecas fechadas, nos recreios e portarias sem vigilância, para o que uma revisão da portaria de rácios, anunciada para ser feita nos gabinetes ministeriais, só pode conduzir a novo fracasso.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a permitir que milhares de alunos fiquem sem aulas de várias disciplinas em longos períodos de cada ano letivo, por não se assumirem orientações que apoiem as situações de deslocação necessária para garantir que os alunos vejam reconhecido o seu direito a terem aulas todos os dias do ano letivo.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a exigir que os docentes tenham de trabalhar sempre para além do que são os limites legais do seu tempo de trabalho, com prejuízo por todos reconhecido da sua vida pessoal e familiar.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar a contar com professores de casa às costas, sem saberem em cada ano em que escola é que vão trabalhar no ano seguinte e com salários que mal chegam para pagar a renda da casa perto da escola e as deslocações que têm de fazer para estarem com a família, por ausência de medidas de apoio à fixação nas periferias.
Quer isto dizer que o orçamento dito de continuidade vai continuar sem remover o amianto, que a lei estabelece que já não deveria existir nos edifícios públicos, mas que se mantém em centenas de escolas por todo o país.
A FNE sustenta que, pelo contrário, do que a Educação precisa é de um orçamento de rutura com aquelas políticas erradas e que já demonstraram que são fonte de descontentamento de milhares de trabalhadores.
O que é errado é pensar e dizer que a continuidade é que é bom.
Do que precisamos é de mudar o que está errado, aquilo que não valoriza as pessoas, que não reconhece nem estimula o empenho profissional, que se limita a uma visão económico-financeira e que não integra uma perspetiva social para o desenvolvimento de uma sociedade com mais equidade. E para o conseguir é imprescindível a corresponsabilização e o envolvimento de todos os parceiros sociais, em práticas de diálogo consistente e com resultados.
Preocupa-nos neste Orçamento esta falta de reconhecimento da importância da educação e da formação, que se traduz num pequeníssimo crescimento do respetivo orçamento, de pouco mais de 1%, e sem ver reconhecido crescimento idêntico ao que se verifica em outros Ministérios, o que é um sinal negativo sobre a relevância que é atribuída a este setor. A verdade é que só no subsetor do ensino não superior continuamos distantes da despesa em Educação de 2009, o que significa que depois do período de ajustamento ainda não recuperamos os valores de despesa anteriores à crise.
No Roteiro para a Legislatura 2019-2023 que o Secretariado Nacional da FNE aprovou, e que já entregou a todos os Partidos Políticos, afirmava-se que deveria ser assumido o compromisso de que o investimento em Educação deveria constituir 6% do PIB. Este é o desafio que se coloca à sociedade portuguesa. E é isto que não acontece com o Orçamento que agora vai ser debatido na Assembleia da República. A reconhecida necessidade de investimento significativo em educação e formação não se traduz, neste Orçamento, em despesa de dimensão adequada, já que esta permanece estável e sem revelar sinais de intervenção, para medidas que apontem para mais qualidade, mais equidade e mais eficácia de todo o sistema educativo. Este é um sinal extremamente negativo para a sociedade, sobre a forma como o Governo encara as condições de um serviço público de educação e formação de qualidade.
O Ministério da Educação não ouviu a FNE, até agora, no processo de elaboração da proposta de Orçamento de Estado, nem procurou discutir as opções que deveriam constituir as políticas mais urgentes para este ano.
Esperamos que a marcação da reunião com o ME para o dia 22 de janeiro possa constituir a oportunidade para que se inicie um verdadeiro processo de diálogo e de concertação que permita a ultrapassagem dos problemas identificados.
A FNE tudo fará para garantir que as justas reivindicações daqueles que representa tenham expressão e estes se possam sentir reconhecidos e valorizados.
Porto, 7 de janeiro de 2020
A Comissão Executiva
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