2-5-2022
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A UGT e os seus Sindicatos celebraram o 1º de Maio, Dia Mundial do Trabalhador 2022, com uma Conferência Sindical dedicada ao “Sindicalismo e os Jovens” e aos “Desafios do Mundo do Trabalho e as Mudanças de Paradigma”, que decorreu, no Auditório Delmiro Correia, sede da central sindical, na Rua Vitorino Nemésio, em Lisboa.
O painel da manhã contou com as intervenções dos jovens sindicalistas Hugo Bahut (SINDEL), Claúdia Silva (SBN) e Carlos Moreira (SINTAP), moderados por Sérgio Monte, Secretário-Geral Adjunto da UGT e responsável pela negociação coletiva da central. O ponto de partida deste painel andou à volta do tema “como convencer um jovem a aderir ao sindicalismo?".
Os três jovens entraram na busca por respostas, apontando várias possibilidades, mas reconhecendo unanimemente que o mundo laboral e o emprego tinham mudado e que a juventude tinha muita dificuldade em se rever neste novo mundo. Para Hugo Bahut é cada vez mais difícil concretizar Contratos Coletivos de Trabalho (CCT) ou Acordos de empresa, uma vez que os contratos são muito díspares entre si.
Em sua opinião, há mais dificuldades que apoios e os jovens não encontram tempo nem disponibilidade para comparecerem nos eventos organizados pelas organizações sindicais: “Sinto que muitas vezes que temos de puxar por eles, porque é preciso trabalhar pelo futuro e esperamos que, com as várias ações que temos realizado, consigamos trazer mais jovens para o sindicalismo. Mas não há nenhuma fórmula certa".
Cláudia Silva assina de cruz e sublinha que "é necessário fazer chegar aos jovens a mensagem de que se não fossem décadas de lutas sindicais eles não teriam os direitos que têm hoje". E dá o exemplo da alta valorização do SAMS, um grande responsável pela alta taxa de sindicalização nos bancários: “Os jovens não podem ignorar que as grandes conquistas não foram simplesmente adquiridas. Passar esta mensagem aos jovens é o nosso grande desafio sindical”.
A falta de estabilidade laboral é uma dificuldade por todos considerada quando o tema é como atrair mais os jovens para o sindicalismo. Cláudia Silva refere que os jovens saltitam muito de emprego em emprego, esta semana trabalham num lugar, para a semana estão em outro emprego. Não têm um apego estável à entidade patronal, o que dificulta a sindicalização".
Carlos Moreira vai direto ao assunto quando enfatiza que “ninguém quer trabalhar de borla: Querem trabalhadores? Então paguem o merecido, o que é justo”. Para ele, tem que haver solidariedade entre gerações, mas os jovens têm que ter um salário digno, para terem estabilidade, uma família, uma casa onde morar: “Não gosto de ouvir que os jovens são individualistas. Nós somos solidários. Não somos individualistas. A nossa missão é descobrir como tornar a causa do trabalho numa causa em que os jovens acreditam. Gostava de ver aqui muito mais juventude a participar neste seminário”.
Carlos Moreira aponta o dedo aos sucessivos governos que "têm apostado numa política de baixa qualificação” e para ele “um país que não aposta na qualificação, não aposta no seu futuro. Temos de deixar de apostar nos baixos salários, subir o salário mínimo e respeitar as carreiras. 48 anos depois do 25 de Abril de 1974 parece que ainda trabalhamos em corporações".
UGT patriótica e fundamental
O painel da tarde, dedicado aos “Desafios do mundo do trabalho. As mudanças de paradigma" juntou o ex-Ministro do Trabalho e Segurança Social José Vieira da Silva (PS) e o ex-Ministro da Economia Álvaro Pereira (PSD), moderados pela jornalista do Jornal de Negócios, Catarina Pereira.
Com uma ajuda visual, José Vieira da Silva analisou o mundo do trabalho – velhos e novos desafios, aludindo a uma situação histórica única e complexa com a confluência de dois grupos de tendências pesadas de mudanças no mercado de trabalho: por um lado, a evolução tecnológica (com a inteligência artificial), as mudanças climáticas, novos modelos de produção, distribuição e consumo e mudanças demográficas.
Por outro lado, a sucessão de crises globais (pandemia e guerra), a desestruturação das cadeias de produção, tendências inflacionistas, riscos recessivos ou contracionistas e alterações do modelo de globalização. Um contexto de destruição ou forte contração de perfis profissionais, com as exigências de novos modelos de educação e formação e de repensar os paradigmas do tempo de trabalho. Os impactos previsíveis são ainda a relocalização de atividades económicas, o abrandamento do crescimento económico e a pressão para a redução dos custos do trabalho. Tal cenário exige, para Vieira da Silva, a regulação eficiente de tensões sociais, a regulação eficiente de modalidades de trabalho a distância e um forte reinvestimento nas capacidades do diálogo social.
Repetindo que o trabalho subordinado (por conta de outrem) empurrou o emprego em Portugal e na Europa, José Vieira da Silva abordou depois as tendências recentes e as fragilidades de alguns mitos no mundo do trabalho. Em sua opinião, as novas formas de trabalho (das plataformas e outras) têm crescido, mas as relações de trabalho dependente são ainda largamente dominantes e na última década explicam todo o crescimento do emprego, tanto na União Europeia, como em Portugal, como comprovam os dados do Eurostat.
Para José Vieira da Silva, as formas atípicas e o trabalho independente apresentam elevados níveis de instabilidade e distintas capacidades de penetração nas diferentes atividades e as estatísticas existentes aparentam fragilidades em captar as tendências mais disruptivas.
Relativamente aos desafios sindicais, o ex-Ministro apontou seis velhos e novos desafios: recuperar a capacidade de ação no trabalho dependente, criar novas formas de organização laboral (nas plataformas, no trabalho independente...) ou enriquecer – como acontece nos países nórdicos - a relação sindical para além da dimensão reivindicativa. A isto acrescentou melhorar a interação – muito frágil – entre a concertação social e a negociação coletiva, reforçar a dimensão da prestação social na ação sindical e valorizar a pertença no espaço europeu.
Por sua vez, o ex-Ministro Álvaro Pereira começou a sua intervenção por um gigante elogio à ação sindical da UGT, que “tem sido altamente patriótica e fundamental”, tendo posto, em várias ocasiões, o interesse nacional acima dos seus próprios desígnios. À pergunta: O que mudou no mundo do trabalho? o atual diretor de Economia na OCDE refere seis itens, que originaram uma diminuição da sindicalização em Portugal e em muitos países do mundo: mudanças setoriais, o envelhecimento da população, a automatização, qualificações e competências, o teletrabalho e mais trabalhos “irregulares”. Apesar desta situação, “a confiança dos portugueses nos sindicatos permanece muito alta”.
Uma mudança estrutural resume-se a menos indústria e mais serviços. Quanto ao inexorável envelhecimento da população vai ditar que o futuro do trabalho seja mais velho, sendo que viver até aos 100 ou mais anos vai criar um enorme desafio à Segurança Social. Numa linguagem mais económica, Álvaro Pereira refere que o rácio de dependência de idosos vai aumentar muito e que a força de trabalho irá diminuir.
Futuro do trabalho pode impulsionar os sindicatos
Que fazer, então, no mercado de trabalho? As respostas poderão ser prolongar a vida ativa dos trabalhadores, incentivos à permanência no mercado de trabalho, repensar as carreiras profissionais, a necessidade de uma aprendizagem ao longo da vida, uma reforma da flexisegurança, podendo os desafios ser ainda maiores em alguns novos setores como a gig economy. Sobre a automatização sabe-se que o fornecimento anual de robots industriais é aos milhares, que 14% dos empregos poderão vir a ser completamente automatizados e 32% venham a sofrer significativas alterações.
O receio em ser-se substituído por um robot é mais forte na exploração espacial, na produção industrial, na busca e resgate, no setor militar e de segurança. Os trabalhadores menos qualificados estão em maior risco com a automatização. No lado menos afetado estão os setores dos cuidados, educação, tempos livres e cuidados de saúde. O lado positivo é que a automatização também gera muitos novos empregos, o que é uma esperança.
A Educação e Formação são cada vez mais determinantes. No entanto, muitos adultos não têm as qualificações necessárias para empregos emergentes. Por outro lado, sublinha Álvaro Pereira, seis em cada dez adultos não tem as qualificações básicas de Tecnologia de Informação ou não tem qualquer experiência com computadores.
A proporção de empregos altamente qualificados aumentou 25% nas últimas duas décadas. Os empregos menos qualificados também aumentaram, mas a proporção de empregos intermédios diminuiu. Uma certeza é que as competências digitais são cada vez mais importantes, logo participar e reforçar as ações de formação é fundamental. Até porque é um dado adquirido que os adultos menos qualificados participam em menos ações de formação. O Estado tem aqui um papel preponderante para derrubarmos os obstáculos à participação na formação de adultos.
Depois de analisar o potencial do teletrabalho em Portugal Álvaro Pereira abordou algumas formas de trabalho “irregular”, que tem aumentado em muitos países e que coloca variados entraves à sindicalização. Como o próprio salientou, os trabalhadores não “regulares” são 50% menos prováveis de ser sindicalizados e em muitos países têm 40 – 50% menos probabilidade de ter apoios de rendimentos quando perdem o seu emprego. O trabalho temporário também tem aumentado e os empregos continuam a ser menos estáveis para os jovens e para os trabalhadores com menos qualificações.
Esta situação tem levado a uma menor sindicalização, provocando desafios na densidade sindical e na cobertura de negociação coletiva. Os jovens são menos sindicalizados, mas a confiança nos sindicatos permanece alta em muitos países, destacando-se pela positiva países como a Bélgica, Finlândia, Canadá, Noruega, Dinamarca ou Suécia. Os jovens entre os 20 e os 34 anos e os adultos entre os 35 e os 54 anos em Portugal demonstram um elevado índice de confiança nos sindicatos, só superados pela Suécia e pela Dinamarca.
Para Álvaro Pereira, o papel das políticas públicas é muito importante no “trabalho do futuro”, sublinhando cinco fatores: aprendizagem ao longo da vida ainda mais relevante, sistema dual e de aprendizagem (“defendo a fusão entre o sistema dual e o não dual”), flexisegurança: mais segurança com mais flexibilidade, reparar os sistemas sociais e prepará-los para sociedades mais envelhecidas, tudo isto com o reforço do Diálogo Social. Algumas boas práticas nesta matéria são os esquemas de retenção e formação (Alemanha), as contas individuais para a formação-aprendizagem (Países Baixos), os vouchers de orientação de carreiras (Bélgica) e a formação orientada para as novas formas de trabalho (EUA, Califórnia).
Quanto à intervenção dos sindicatos no novo mundo do trabalho Álvaro Pereira acredita que o “futuro do trabalho” poderá proporcionar um forte impulso ao sindicalismo. Porém, para que tal aconteça é fundamental que os sindicatos se adaptem às novas práticas no mundo do trabalho (por exemplo: teletrabalho, mais flexibilidade e segurança, mais aprendizagem). O ex-Ministro vê nos sindicatos uma peça indispensável para o futuro e para a prosperidade do país, dando como exemplo o acordo de negociação de concertação social. Álvaro Pereira não tem dúvidas que “a UGT vai estar no centro das grandes reformas que vão ter de acontecer em vários setores da nossa economia".
1º de Maio na rua em 2023
As intervenções finais ficaram para a Presidente e para o Secretário-Geral da UGT. Lucinda Manuela Dâmaso referiu que a UGT celebrou este 1º de Maio a pensar nos que sofrem com a precariedade, nas mulheres trabalhadoras que recebem menos do que os homens em cargos iguais, nos jovens tão necessários para os sindicatos e também nos milhares de trabalhadores pobres.
Nesse sentido, "a UGT vai aceitar o repto que o Primeiro-Ministro lançou dizendo que era impensável que ainda existissem trabalhadores pobres. Por isso, nós dizemos daqui, Sr. Primeiro-Ministro, a UGT está interessada em trabalhar com o Governo para que estes trabalhadores deixem de ser pobres e tenham uma vida digna". Devido à inflação, "os trabalhadores que pertenciam à classe média vão passar a ser pobres. Por isso, é fundamental aumentar os rendimentos, seja por aumento de salários, ou por redução de impostos. A UGT não vai desistir da dignificação do trabalho".
No seu primeiro discurso como novo Secretário-Geral da UGT, Mário Mourão, deixou o desejo e compromisso de "trazer o sindicalismo para o século 21", adaptado às mudanças, aos desafios e a novos comportamentos". Mas a ideia forte do seu discurso passou pelo salário médio, para o que “urge passar das palavras aos atos". De outro modo, "a luta - na rua – acontecerá, se os governos e patrões fizerem orelhas moucas aos salários dignos que exigimos para a Administração Pública, para o Setor Privado e para o setor Empresarial do Estado".
A precariedade, a reposição do poder de compra devido à subida da inflação, os despedimentos selvagens e injustificados (“hipocritamente denominados de rescisões por mútuo acordo") e o impacto das fusões, concentrações ou vendas de grandes empresas são também apontados. A rematar, Mário Mourão deixou a garantia de que no 1º de Maio de 2023 a UGT voltaria à rua para reclamar todos os direitos que os trabalhadores portugueses merecem e querem ver garantidos.
Fotos: UGT/FNE
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