“Temos um problema de Justiça no nosso sistema educativo”

29-5-2017

“Temos um problema de Justiça no nosso sistema educativo”
Afirmação proferida pelo Secretário de Estado da Educação, João Costa, na V Convenção Nacional ANDAEP, CONFAP, FNE


"Uma das melhores convenções de sempre" foi um comentário repetido por participantes de todo o país da "V Convenção Nacional ANDAEP, CONFAP, FNE - "A Avaliação na Educação para uma Escola de Qualidade e de Equidade - desafios, soluções e consequências na progressão de estudos", que decorreu no sábado de 27 de maio de 2017, na Universidade Fernando Pessoa, no Porto, e que contou com a presença de João Costa, Secretário de Estado da Educação e de Helder Sousa, Presidente do IAVE.

A sessão de abertura esteve a cargo de Salvato Trigo, Reitor da Universidade Fernando Pessoa, dos Presidentes da ANDAEP (Filinto Lima) e da CONFAP (Jorge Ascensão) e do Secretário-Geral da FNE, João Dias da Silva. Salvato Trigo contextualizou a importância histórica de iniciativas como esta, fundamentando-se no pensamento de Aristóteles e confessando que "em Portugal somos muitos a complicar e muito poucos a procurar soluções".

O painel da manhã, intitulado "A Avaliação na Educação para uma Escola de Qualidade e de Equidade - desafios, soluções e consequências na progressão de estudos, no quadro da avaliação e da progressão dos alunos e do acesso ao ensino superior", teve a intervenção de Helder Sousa (Presidente do IAVE) e José Augusto Pacheco (Universidade do Minho).

"Temos um sistema que não funciona", começou por afirmar o Presidente do IAVE, e uma escola muito refém de conteúdos e muito condicionada pelo manual escolar. Em sua opinião, é urgente a mudança de paradigma na avaliação, até porque a maior prisão que os professores têm "é dar o programa". O novo paradigma tem forçosamente que passar por uma avaliação mais formativa e mais contínua, libertando-se do peso excessivo dos testes, que são instrumentos que nem sempre são os mais corretos.

O Presidente do IAVE referiu que temos que acabar de uma vez por todas com "a semana de congestionamento de testes" nas escolas e lamentou que a construção de instrumentos de avaliação não faça parte da formação inicial dos docentes. Para Helder Sousa a mudança na avaliação terá que ultrapassar os constrangimentos do currículo, um secundário dependente do acesso ao ensino superior e uma avaliação de desempenho que vise estigmatizar os professores, não contribuindo para a melhoria das suas práticas pedagógicas em sala de aula e para o seu domínio científico.

Helder Sousa apresentou novos modelos de acesso ao ensino superior e acabou por admitir que "é demolidor, desumano e inaceitável que um aluno não entre na faculdade por uma décima". Por outro lado criticou as escolas que começam logo no 1º ciclo a fazerem baterias de testes de exames, sugerindo que em vez disso poderiam treinar os seus alunos nos diferentes tipos de perguntas. "Mudar é uma tarefa em comum", realçou. "E a educação é o maior património social e económico de um povo." Por isso, não pode haver boa educação sem uma avaliação de qualidade.

Por sua vez, José Augusto Pacheco, da Universidade do Minho, abordou o tema da "Avaliação no Período Pós LBSE (1986-2017), mencionando quatro ciclos de mudança: 1) ciclo de reforma (1981); 2) ciclo de gestão flexível (1987); 3) ciclo de reforma parcial (2011) e 4) um ciclo de inovação tecnológica (2017). No seu entender, temos uma duplicidade na avaliação, constituída por uma escola normativa e uma escola de práticas escolares, de testes, tendo nos últimos anos persistido um acento tónico na avaliação externa. Daqui ser lícito perguntarmos "se esta avaliação externa serviu para alguma melhoria da qualidade da escola, da educação". Outro ponto a realçar é que a sociedade (e os pais nela) não estão preparados para uma escola sem testes.

José Augusto Pacheco centrou-se de seguida na questão das repetições e da retenção escolar e mostrou-se preocupado com o nível de conhecimentos com que os alunos terminam o 9º, 11º e 12º anos e mesmo com os que terminam o superior. Além disso, é urgente valorizar a profissão docente no seu todo (em condições de trabalho e em salários) e temos que discutir a maioria dos programas, que estão por alterar. "A sociedade portuguesa está adormecida quanto a isto. Será adequado andar-se três meses a estudar-se um autor?", perguntou.

O painel da tarde teve por título "A Avaliação na Educação para uma Escola de Qualidade e de Equidade - desafios, soluções e consequências na progressão de estudos, no quadro do desenvolvimento do perfil do aluno à saída da escolaridade obrigatória", e contou com a presença de Bravo Nico (Universidade de Évora), Lurdes Figueiral (Presidente da Associação de Professores de Matemática) e João Costa, Secretário de Estado da Educação.

A intervenção de Bravo Nico focou a questão da falta de ofertas educativas no interior do país, acentuadamente no Alentejo, e as más consequências socioeconómicas a que obriga os respetivos alunos e suas famílias. "Temos um desafio do exercício do direito à educação no interior de Portugal, o que é um retrocesso nas oportunidades que tivemos", sublinhou Bravo Nico. "Temos no fundo um Abandono Escolar do Estado, que abandonou uma rede educativa e deixou o interior entregue a si próprio. A torneira do financiamento da educação do interior já se fechou há muito tempo e estamos a viver uma tragédia demográfica estudantil." Para Bravo Nico, uma verdadeira política educativa deve ter valências para dar oportunidades a todos.

Lurdes Figueiral, Presidente da Associação de Professores de Matemática, foi peremtória em afirmar que "não somos uma escola inclusiva em Portugal, pois temos grandes franjas de exclusão de alunos". Para Lurdes Figueiral as aprendizagens não são lineares nem cumulativas e não há nada neutro em Educação - nem a própria avaliação. O conhecimento e o saber também não são optativos numa escola inclusiva e o pior que podemos fazer é "aceitarmos a exclusão como se ela fosse inevitável".

João Costa tomou de seguida a palavra para realçar que "temos um problema de justiça no nosso sistema educativo", mencionando o abandono escolar e a retenção. O secretário de Estado da Educação frisou que é preciso pensar o desafio da finalidade da escola e que o objetivo da avaliação é aprender melhor. As consequências disto são o recentrar a avaliação no formativo, ter uma avaliação sobre todas as áreas do currículo, termos práticas de avaliação contínua e sabermos dar um bom estímulo à diversificação dos instrumentos de avaliação. "Avaliar só para testes é redutor", afirmou. "E não está escrito em lado algum que deve haver dois testes por período". Se queremos uma escola inclusiva, reconheceu João Costa, "os instrumentos de avaliação devem também ser inclusivos".

Resultado da V Convenção foi uma declaração conjunta das três organizações intitulada "Governança na Educação - Por Uma Educação de Qualidade e com Equidade", que vai ser entregue ao Presidente da República e ao Governo português.

A V Convenção ANDAEP, CONFAP, FNE, teve transmissão em direto pela FNE TV, através do endereço: tv.fne.pt. Os participantes interessados podem agora requerer ao Diretor do Centro de Formação Pedagógica da FNE, João Dias da Silva, o seu reconhecimento e certificação como ação de curta duração de cinco horas.  


Declaração conjunta pode ser consultada AQUI

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Programa

Cartaz da V Convenção Nacional 2017